Publicado no NGZ,
Outubro 2017
Dous potentes e
falsos argumentos se utilizaram para desacreditar a medicina
tradicional baseada no uso de ervas medicinais frente à medicina
moderna baseada nos medicamentos de síntese. Primeiro foi necessário
desprestigiar a sua utilidade: as ervas nom fam nada. O segundo
argumento apareceu depois, garantindo a impossibilidade do retorno:
as ervas medicinais som mui perigosas. Mesmo assim, o prestígio
curativo de algumhas de estas ervas malditas continua vivo e
compre defendé-lo.
A ruda (Ruta
graveolens), a que cheira bem e cheira mal e espanta às meigas
se levamos um raminho no peto, é umha de estas ervas malditas. Medra
às portas de tantas casas e som tantas as testemunhas vivas e as
consumidoras habituais da ruda, que resulta difícil acreditar nos
símbolos com caveiras das guias de ervas medicinais, que sempre
alarmam: a ruda é abortiva. É-o, como o é, por exemplo, o poejo, a
erva que tomamos cada vez que pedimos um chá de menta depois dumha
comida copiosa. Aliás, antes que como abortiva, a ruda, igual que o
poejo, pode utilizar-se como anti-conceptiva; a maldiçom de muitas
ervas bem de muito longe, e está mui ligada à perseguiçom do
controlo por parte das mulheres da sua própria sexualidade . A ruda
vai bem para as dores de barriga das mulheres, pois é um
espasmolítico e emenagogo excelente; podemo-la utilizar como
estomacal, sedante dos nervos e da dor, em enfermidades que cursem
com febre e, mesmo aplicada do mesmo jeito que para espantar as
meigas, para problemas circulatórios como as varizes, pois é um
dos flebotónicos mais eficazes que reconhece a moderna fitoterápia.
A durmideira
(Papaver somniferum) é muito mais difícil de ver à porta
das casas, ainda que muitas lembramos que nom era assim fai apenas um
par de décadas, quando começou a pior das difamações: é umha
droga. Sim, é-o realmente, e dela obtem-se facilmente o ópio, por
médio de umha simples incisom da cápsula imadura da flor. Mas
parece que tradicionalmente fazia-se mais bem o uso da flor, cozida
ou em chá, e utilizava-se principalmente como sedante e calmante da
dor. Aquelas pessoas que tem problemas para durmir podiam
experimentar o simples facto de colocar baixo da almofada um punhado
de flores da durmideira para comprovar os efeitos de esta potente
droga, sem esquecer que droga é sinónimo de medicamento.
Outras, as que nom
som drogas nem abortivas, som potentes venenos. A mais de umha
surpreende o uso tradicional ainda vivo da ceruda, cedronha,
celidónia, erva andorinha ou erva das verrugas (Chelidonium
majus) sobre golpes e feridas abertas ou do seu látex disolto em
auga para a gastrite. Como pode ser, se a ceruda é mui venenosa, se
queima? É bastante comum o conhecimento sobre a utilidade do látex
amarelo da erva para queimar as espulhas, mas está a ficar no
esquecimento a sua utilidade como remédio para problemas
hepático-biliares, bronquite, enfermidades da pele e dos olhos,
bócio, dores dentais, dores menstruais, sedante e analgésico,.. E
tantas utilidades mais que se resumem no dito “a ceruda todos os
males cura”.
Vem tempos de romper
com a maldiçom. Andamos à procura de outras maneiras de sanar,
sentimos que a natureza pode fornecer-nos a medicina que precisamos.
Já só fica romper com a barreira do auto-ódio que nos impede
encontrar a sabedoria e os recursos necessários aqui, entre a nossa
gente e na nossa Terra.